No mês de abril, os sinais de um cenário econômico cada vez mais desafiador se tornam evidentes. Inflação acima da meta, dólar instável, juros altos e tensões no comércio internacional provocadas pelas tarifas impostas pelos Estados Unidos sob o comando do presidente Donald Trump. Aqui no Brasil, mesmo com leve recuo da cesta básica em regiões como Petrolina, produtos essenciais como café e feijão seguem em alta. Para analisar esse quadro, recebemos o professor João Ricardo Lima, doutor em Economia e representante do colegiado de Economia da FACAPE.
Sobre a atual situação da economia brasileira, com inflação elevada e taxa Selic mantida em 15%, o professor João Ricardo foi direto:
“Nós estamos, sim, diante de um risco de estagflação — que é esse fenômeno preocupante quando a economia fica estagnada, mas ainda assim convivemos com uma inflação alta. Esse é um dos cenários mais difíceis de gerenciar. E, como você colocou, o contexto nacional e internacional é bastante complexo. Tivemos um crescimento acima de 3% no ano passado, o que é uma boa notícia, e o FMI estima que continuaremos crescendo em 2025, ainda que num ritmo mais lento. O número de pessoas empregadas é recorde e os rendimentos médios estão entre os mais altos da série histórica da PNAD. Isso mostra que há dinâmica econômica. Só que, com mais gente empregada e consumindo, e com o governo também gastando, vem o problema da inflação — especialmente a de alimentos, que é a que mais pesa no bolso da população.”
O professor explica que, embora a inflação geral esteja um pouco acima de 5% no acumulado de 12 meses, a inflação de alimentos dentro do domicílio chega perto de 8%. Isso afeta diretamente o poder de compra:
“O impacto é real. Você vai ao supermercado e percebe que com o mesmo salário está levando menos produto. Isso explica, inclusive, por que os indicadores econômicos afetam tanto a avaliação dos governos. A população sente isso na pele.”
Sobre o uso da taxa Selic como ferramenta de controle, João Ricardo destacou:
“A elevação da Selic é a principal arma do Banco Central para conter a inflação, mas ela tem um efeito colateral importante: encarece o crédito e retrai o consumo. Isso já está sendo sentido pelo setor produtivo, que aponta queda nas vendas e no movimento de clientes. É um freio necessário, mas que cobra seu preço na atividade econômica.”
A instabilidade cambial também foi abordada. O professor explicou como a desvalorização do real pode beneficiar exportadores, mas também encarece produtos importados, o que acaba pressionando a inflação:
“Para regiões como o Vale do São Francisco, que exportam frutas, o dólar mais alto é bom. Mas por outro lado, muitos insumos são importados, e aí o custo de produção sobe. Isso encarece tudo. É um jogo de empurra, porque qualquer mudança num indicador afeta os outros.”
Ao comentar o comportamento misto da cesta básica — com queda geral, mas alta de itens como café e feijão — João Ricardo pontuou que fatores climáticos e decisões de produtores têm papel central:
“Quando há quebra de safra em outros países, como ocorreu com a manga e o café, a demanda pelo Brasil cresce e os preços sobem. No caso do feijão, o preço ficou tão baixo que muitos produtores desistiram de plantar, e aí a oferta caiu, o que levou os preços a dispararem. São movimentos de mercado, influenciados por clima, por decisão dos produtores e também por fatores internacionais, como no caso dos ovos, que subiram porque os Estados Unidos enfrentaram surto de gripe aviária, e a gente passou a exportar mais.”
A guerra comercial entre Estados Unidos e China também preocupa. O presidente Trump impôs uma tarifa de 10% sobre produtos importados, o que afeta o Brasil. João Ricardo explicou os dois cenários possíveis para a fruticultura local:
“Pode ser que os americanos, pressionados pela inflação, reduzam o consumo de frutas, priorizando produtos mais essenciais. Isso seria ruim pra gente. Mas há quem defenda o contrário: que eles vão adiar compras de bens duráveis e ficar mais em casa, consumindo mais alimentos, inclusive frutas. Isso seria positivo. É cedo pra dizer qual dos cenários vai prevalecer.”
Sobre o impacto global dessas decisões americanas e como isso afeta o Vale do São Francisco. O professor respondeu com sua metáfora preferida:
“A gente costuma dizer que os Estados Unidos são a locomotiva e o Brasil é um dos vagões. Se a locomotiva desacelera ou descarrila, todo o trem sente. E hoje, o que mais me preocupa é a tendência de desvalorização do dólar. Isso beneficia a importação e reduz custos para alguns setores, mas prejudica as exportações. A fruticultura do Vale, que depende de câmbio favorável, pode perder competitividade se o dólar cair muito.”
Sobre o que as famílias devem fazer em tempos de inflação alta e juros elevados, o professor reforçou a importância da educação financeira:
“É hora de saber exatamente pra onde vai cada centavo. Ter controle, anotar, planejar. Não cortar saúde, nem educação, mas talvez reduzir supérfluos, ajustar os gastos. É algo que a gente precisa cultivar como cultura, até pra atravessar momentos difíceis com mais segurança.”