Categoria define pauta da 32ª campanha com foco em valorização da mão de obra, alimentação no local de trabalho e fim da jornada 6×1
Os trabalhadores assalariados rurais de Petrolina e de todo o Vale do São Francisco aprovaram a pauta de reivindicações que vai guiar a 32ª Campanha Salarial da categoria em 2026. O documento é resultado de dois dias de debates, nos dias 16 e 17 de setembro, que reuniram delegados sindicais, entidades parceiras e especialistas para discutir desde o cenário econômico até as condições práticas de trabalho no campo.
O encontro contou com a participação do Dieese, da Confederação Nacional, da CTB nacional e estadual, da Oxfam Brasil, além de advogados que vão atuar nas negociações. Representantes de sindicatos de Belém do São Francisco, Lagoa Grande, Inajá e Petrolina também estiveram presentes.
A presidente do Sindicato dos Trabalhadores Assalariados Rurais de Petrolina (STTAR Petrolina), Maria Joelma, explicou em entrevista ao Nossa Voz que a principal meta da campanha é garantir valorização da mão de obra.
“Nós não temos um salário digno, não temos plano de saúde, não temos fardamento, não temos alimentação no local de trabalho, não temos reforço alimentar. É preciso mudar essa realidade. O trabalhador quer qualidade de vida, não é só produzir”, destacou Joelma.
Piso salarial e valorização da mão de obra
A proposta aprovada prevê um piso salarial de R$ 1.760, mas Joelma alerta que a luta vai além do reajuste financeiro. Segundo ela, já há empregadores oferecendo diárias de até R$ 300 para atrair trabalhadores, o que mostra que o mercado reconhece a necessidade de pagar melhor.
“O que falta é valorização. Muitos estão saindo da carteira assinada para o trabalho informal, porque recebem mais. Mas isso também é perigoso, porque abre espaço para a pejotização. O trabalhador vira CNPJ e perde férias, décimo terceiro, previdência. Passa a ser escravo de si mesmo”, disse.
Saúde, assédio e direitos
Joelma ressaltou que a categoria enfrenta problemas graves de saúde relacionados ao trabalho repetitivo, como lesões ortopédicas e doenças renais, além de transtornos psicológicos gerados pelo assédio moral.
“Tem trabalhadores que não podem nem ir ao banheiro em paz, porque alguém fica contando quantas vezes eles saem. Isso gera ansiedade, depressão. E ainda enfrentam dificuldade para que as empresas aceitem declarações médicas de psicólogos e fisioterapeutas como atestado. É desumano”, criticou.
Outro ponto debatido foi a necessidade de plano de saúde e alimentação adequada para os trabalhadores rurais. Joelma cobrou que o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), criado há mais de 40 anos, seja implementado de fato no campo.
“Quem tem condição de comer carne todos os dias em casa? No campo, o trabalhador precisa ter refeição de qualidade, com acompanhamento nutricional. Isso nunca foi levado a sério nas negociações”, completou.
Jornada de trabalho: o fim do 6×1
Uma das maiores demandas da categoria é o fim da jornada 6×1, que obriga o trabalhador a atuar seis dias consecutivos e descansar apenas um.
“No domingo, a gente não descansa, a gente trabalha dobrado cuidando da casa. Quando chega segunda-feira, já amanhece cansado. O trabalhador quer vida. Quer tempo de levar a família para o parque, para a beira do rio, para um lazer simples. Mas como, se não sobra tempo?”, questionou a dirigente sindical.
Feriado histórico e conquistas
A pauta também inclui a luta para transformar 17 de fevereiro em feriado oficial da categoria, data em que foi concluída a primeira negociação coletiva em 1994.
“Esse é um marco da nossa história. Mas até hoje é apenas um feriado facultativo, que precisa ser trocado por outro dia. Queremos reconhecimento oficial, sem compensação”, defendeu Joelma.
Cenário econômico e impacto nas negociações
Mesmo com a taxação sobre produtos brasileiros, como manga e uva, Joelma não acredita que haverá prejuízo às negociações no Vale do São Francisco.
“O que falta para o empregador não é mercado, é mão de obra. O México já encerrou a safra e o Brasil virou exportador exclusivo para os Estados Unidos. Nossa fruta tem qualidade e está valorizada. O problema é que o trabalhador também quer ser valorizado”, pontuou.
A pauta aprovada seguirá agora para assembleia geral, onde será validada oficialmente antes de ser entregue ao sindicato patronal. Joelma reforçou que a luta é coletiva e que o objetivo é transformar cada reivindicação em conquista concreta.
“Nós não temos como produzir se estamos doentes e desvalorizados. A produção só vai avançar se houver investimento no trabalhador, que é quem garante o alimento na mesa e a fruta que sai daqui para o mundo”, concluiu.