Ararinhas-azuis são encontradas com circovírus na Bahia e especialistas alertam para risco ao projeto de reintrodução

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O Ministério do Meio Ambiente confirmou que as 11 últimas ararinhas-azuis que viviam soltas na natureza, em Curaçá, no norte da Bahia, estão contaminadas pelo circovírus, um vírus que afeta aves, não tem cura e provoca alterações na plumagem. A confirmação acendeu um alerta entre pesquisadores e entidades ambientais, já que a espécie passou mais de duas décadas extinta em vida livre e havia voltado à Caatinga recentemente.

Para entender o impacto da contaminação e os próximos passos do programa de conservação, o Nossa Voz conversou com o ambientalista Victor Flores, que há mais de 10 anos atua na pesquisa, educação ambiental e acompanhamento da reintrodução da ararinha-azul.

De acordo com o especialista, o momento é delicado, mas ainda não significa uma ameaça imediata de mortalidade. “É muito preocupante porque mostra a fragilidade do grupo reintroduzido. Mas o circovírus não matou nenhuma ararinha-azul. O que observamos foram penas brancas, que são o principal sintoma”, explicou.

Ele conta que as investigações começaram após um filhote nascido em vida livre ser registrado com plumagem alterada ao deixar o ninho, em março. Três laboratórios analisaram amostras das aves, e apenas três ararinhas tiveram resultados positivos consistentes nos exames.

Segundo Victor, apesar da gravidade, o vírus não deve ser tratado como um fator capaz de encerrar o projeto. “O que está em jogo é o futuro de uma espécie. O circovírus existe no Brasil há mais de 20 anos. Precisamos entender como conviver com ele. Não podemos sacrificar as aves nem interromper o programa sem usar esse aprendizado para a ciência”, afirmou.

O pesquisador também demonstrou preocupação com conflitos recentes entre o criador responsável pelo centro de reprodução e órgãos ambientais. Ele citou multas altas aplicadas nos últimos dias, inclusive contra uma veterinária que teria sido penalizada por colocar água para um animal silvestre. “Quando a gente vê multas de mais de R$ 1 milhão e penalizações por atos simples, fica claro que, além do vírus, existe um conflito institucional. E isso não ajuda a ararinha-azul”, disse.

Apesar das tensões, o ICMBio informou que não pretende interromper o processo de reintrodução. Para Victor, a continuidade depende de união e mais investimentos. “Precisamos de reforço na biossegurança, ampliar os criadouros, combater o tráfico de animais e manter um cordão de proteção na Caatinga. Hoje, boa parte do centro é mantida por instituições internacionais. É essencial que o Brasil também assuma esse compromisso.”

O ambientalista lembra que o tráfico de animais silvestres ainda é um dos maiores desafios no Nordeste, com apreensões frequentes e venda ilegal de aves em feiras livres. “Isso enfraquece qualquer tentativa de conservação. A sobrevivência da ararinha-azul depende de muitos atores trabalhando juntos”, destacou.

A confirmação da contaminação reacende o debate sobre os rumos do projeto e a urgência de medidas que garantam a permanência da espécie em seu habitat natural. “Este não é o momento de embate. É o momento de união pela ararinha-azul”, concluiu Victor Flores.