Além das atividades que envolvem os 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres, a União Brasileira de Mulheres levantou uma campanha em Petrolina contra a música “Dar uma namorada”, da dupla Israel e Rodolffo. A faixa teve um videoclipe lançado na última sexta-feira (19) e levantou polêmica entre coletivos de mulheres em todo o país. A feminista e integrante da UBM Petrolina, Socorro Lacerda, trouxe argumentos contundentes, em entrevista ao Nossa Voz desta segunda-feira (22).
“Eu publiquei nas minhas redes o nosso protesto contra essa música e muitos homens fizeram comentários afirmando que as mulheres também estão cantando e não estão nem aí. É preciso que essas mulheres, assim como os homens, elevem as suas consciências e entendam que a gente não pode subestimar os discursos que encorajam a prática do estupro. Porque essa música, embora pareça ingênua, tem um fragmento que diz: ‘Se você me atiçou vai ter que dar uma namorada’. Então aqui está um recado para os machistas: Nós não temos que fazer nada, porque a mulher não é obrigada a nada. E isso nos remete às situações onde dizem que a “mulher provocou”. Ainda assim, machistas que estão nos ouvindo, vocês não tem o direito de invadir os corpos das mulheres”, disparou.
A ativista assegurou ainda a necessidade do combate ao discurso machista. “A ingenuidade que está por trás dessa música onde dizer que isso é só uma brincadeira, não é. Se a mulher provocou, meu querido, isso não quer dizer que ela quer ser invadida, que ela quer ter seu corpo aviltado, violentado, violado porque a dignidade sexual da mulher está garantida na Lei e que estuprar é crime e está previsto no código penal, é o artigo 213, vai preso. É preciso que essas músicas nos respeitem. Nós temos Leis que garantem, inclusive em Petrolina tem Lei que garante que esse tipo de indústria cultural não pode utilizar os nossos corpos para lucrar. Então nós estamos aqui para protestar, já marcamos a gravadora, no sentido de que esta música seja retirada e vários coletivos de mulheres feministas protestaram contra esse abuso que é esta música e ela ainda é esse hit. Mesmo assim nós não vamos nos calar”.
Para Socorro, o momento também é crucial para reforçar as variadas formas de violência sexual. “É preciso que nós registremos aqui que 80% dos estupros ocorrem com estupradores conhecidos e tem mulher que nem sabe que está sendo estuprada. Houve um tempo em que o estupro marital era consentido, onde a mulher era obrigada a ter relação sexual com seu companheiro. (…) Isso é fato e nós temos a projeção de que esses estupros, as subnotificações ainda não representam ainda o que é a realidade. Porque o estupro, como muita gente pensa que vai ser num beco escuro, numa noite, num beco escuro, não é essa a realidade. Os estupros acontecem dentro das casas, por estupradores conhecidos das vítimas”.
Atualmente, estima-se que a cada oito minutos uma mulher é estuprada no Brasil. “Antigamente, dizia-se que estupro era a conjunção carnal do pênis com a vagina. Isso mudou porque nós lutamos para que esse conceito de estupro fosse modificado e compreendido que o estupro era você tocar no meu corpo sem o meu consentimento, nas minhas partes íntimas, porque é a minha dignidade que está em jogo. Então, esses homens que acham que sua macheza é agredir, é usar da violência, que está na sua iniciativa de invadir aquele corpo, não meu querido. A sua macheza está na sua delicadeza, com calma e respeito as mulheres”.
Por fim, Socorro Lacerda cobra políticas públicas voltadas à conscientização contra as variadas formas de violência de gênero. “Nós sentimos falta, em todas as esferas de governo, de campanhas educativas no sentido de elevar a consciência das meninas principalmente e as meninas que estão nos ouvindo, são vocês, queridas, são vocês mulheres que vão fazer com que este respeito exista na prática. Os nossos corpos não estão à deriva para serem invadidos. O seu corpo só pode ser tocado se houver o seu consentimento. O homem chega para a gente questionando se não pode mais paquerar. Meu amor, paquerar parte da sua delicadeza, paquerar é diferente de você me desrespeitar. É muito diferente de você dizer que ela te provocou, que a roupa dela tem um decote aparecendo, mas ela estava mostrando as coxas… E daí? O corpo é meu, eu visto a roupa que eu quiser porque o corpo é meu”.
Nesses dias 16 dias de ativismo
16 dias de ativismo
No próximo sábado (17) a União Brasileira de Mulheres realizará nos sinais de trânsito no Centro de Petrolina, um adesivaço pelo fim da violência contra a mulher. Na sua participação ao vivo no Nossa Voz, Socorro Lacerda fez o convite. “Mulheres, participem de máscara, levem o álcool e vamos fazer esse adesivaço, lembrando dos 16 dias de ativismo e que violência é crime e viver sem ela é um direito humano das mulheres. Até 10 de dezembro nós estaremos nessa campanha”.