Por: Revista Algo Mais
Semanas atrás, dois políticos que tinham forte identificação com seus partidos – Marcelo Freixo que era do PSOL e Flávio Dino, do PCdoB – surpreenderam ao declararem sua filiação ao PSB. Nesta conversa com Cláudia Santos, a cientista política, professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), Nara Pavão, analisa como essas duas figuras, de atuação reconhecida nacionalmente, podem beneficiar a legenda socialista, em especial em Pernambuco.
Nara comenta também as perspectivas para as próximas eleições e afirma que o presidente Jair Bolsonaro tem chances de se reeleger. Segundo a cientista política, ele conta com uma base de eleitores incondicionalmente fiel e pode trabalhar os resultados da vacinação e da recuperação econômica (que deve acontecer no ano que vem) a seu favor. Mas caso seja rejeitado nas urnas, ela acredita que tentará um golpe, porém não contará com o apoio de setores da sociedade e, provavelmente, não terá sucesso. Autora de uma pesquisa sobre fake news nas eleições de 2018, ela assegura que as notícias falsas não têm a capacidade de mudar o voto das pessoas, mas é munição para acirrar ainda mais a polarização.
Como a senhora analisa a filiação de Marcelo Freixo e Flávio Dino ao PSB?
Acho que há dois efeitos. O primeiro deles é sobre a fragmentação partidária. Esses dois políticos estão saindo de partidos menores para um partido um pouco mais estruturado. Então, isso é visto positivamente porque o sistema partidário brasileiro é muito fragmentado e a ida desses dois políticos para um partido um pouco mais forte sinaliza na direção da redução da fragmentação. Claro que o PSOL e o e o PCdoB não deixam de existir porque esses dois políticos saíram desses partidos. Mas, essa saída é boa porque diminui um pouco essa fragmentação. São políticos de peso que vão para o mesmo partido e para um partido que já era um pouco mais forte do que aqueles que eles estão deixando para trás.
Outro efeito é que tanto o Dino quanto o Freixo são políticos claramente associados com à esquerda. Não são ambíguos em relação a isso. Já o PSB é um partido um pouco amorfo, principalmente no nível nacional. Ele não tinha uma marca ideológica muito forte. Com a ida desses dois políticos claramente de esquerda, o PSB assume mais o seu perfil de esquerda mesmo. E isso fica mais claro, sinaliza para população que o PSB é um partido de esquerda. Então, eu acho que os dois efeitos são bons.
Existe a possibilidade do PCdoB se fundir ao PSB? É possível ter sucesso uma frente da esquerda e centro-esquerda?
Em relação à primeira parte da pergunta, eu não saberia dizer quais são as reais intenções do PCdoB e se de fato quer se fundir ao PSB. Agora, é possível, sim, ter uma frente de esquerda e de centro-esquerda. A de centro-esquerda é a que estão querendo costurar. Na verdade, quem conseguir ganhar o centro, seja a esquerda, seja a direita, vai ter uma vantagem muito grande em 2022. E no atual momento, a esquerda está sendo mais capaz de flertar com centro do que a direita, e muito devido à moderação dos atores de esquerda, que entendem que o momento requer essa união e essa moderação. Ou seja, em razão dessa aproximação da esquerda com o centro, como também pelas ações deliberadas de Lula de tentar costurar uma aliança que envolva forças mais moderadoras, é muito possível que se forme uma coalizão de centro-esquerda.
Quais as repercussões que essa situação traz para o cenário político de Pernambuco?
Isso é muito positivo para o PSB. Pernambuco é um Estado muito petista, a força do PT e do lulismo é muito forte no Estado e no Recife. Então, é muito positiva para o PSB essa identificação mais forte com as forças de esquerda, com partidos de esquerda e com líderes claramente de esquerda. E não me refiro apenas a essa aproximação do PSB com Flávio Dino e com Freixo mas, também, à aproximação de Lula com PSB. Inclusive ele está combinando uma vinda a Pernambuco para, exatamente, costurar essas alianças. Então, eu acho que isso tende a fortalecer o PSB no nível estadual e no nível nacional, ao se apresentar mais claramente como um partido de esquerda ou de centro-esquerda.
Huck e Amoêdo desistiram de se candidatar para a Presidência da República. Por que candidaturas encaradas como “terceira via” continuam inviáveis na conjuntura atual?
A polarização é muito forte. O PT, Lula e as forças de esquerda estão se unindo mais, se identificando e se assumindo mais enquanto forças de esquerda e, principalmente, enquanto forças de oposição ao Bolsonaro. E tem também o lado bolsonarista que é bastante forte, bastante coeso e que representa, sim, um peso importante para 2022. Se você perguntar para a população, grande parte dela não gostaria de votar em Lula e em Bolsonaro. Existe essa demanda por uma terceira via. O que não existe é consenso a respeito do formato, da cara dessa terceira via. Não é fácil preencher e criar uma terceira via viável e com apelo que inspire consenso na população num momento de alta polarização. Não é um trabalho trivial. Amoêdo não seria um consenso, eu não o vejo como uma terceira via. Huck seria, porque ele, inclusive, tem se apresentando como a terceira via, como alguém que está muito no centro e que teria capacidade de diálogo e que seria um outsider. Por isso avaliava a candidatura dele como sendo a que poderia ter maior sucesso nesse sentido. Amoêdo não acho que conseguiria se apresentar como uma terceira via viável, acho que ele já é muito associado a forças da centro-direita. Ele é um centro-direita diferente da direita tradicional, acho que a demanda para esse tipo de político é muito baixa no sistema atual.
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