“Essa taxa torna inviável exportar manga para os EUA”, diz presidente da Abrafrutas

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O primeiro dia de reuniões entre representantes do agronegócio brasileiro e o governo federal, realizado nesta terça-feira (15), foi marcado por preocupação e apelos à diplomacia. O motivo: a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas de até 50% sobre produtos importados do Brasil, entre eles alimentos como frutas e sucos.

A medida acendeu o alerta em diversos setores da economia brasileira, principalmente no polo exportador de frutas do Vale do São Francisco. O presidente da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas), Dr. Guilherme Coelho, participou dos encontros representando a fruticultura nacional e fez um apelo contundente para que os alimentos fiquem de fora do que chamou de “tarifaço americano”.

“Essa safra da manga é uma safra que existe há muitos anos. A relação do Brasil com os Estados Unidos é uma relação muito boa, que vem de 200 anos atrás. Os produtores se organizam, seus packing houses, seus parceiros, porque um problema desse,atinge a todos”, afirmou Guilherme Coelho.

Segundo ele, a produção de manga segue um planejamento rigoroso e sensível ao tempo:

“Você compra toda a embalagem, as caixas, os pallets, se organiza para reservar o local dos contêineres nos navios. Uma programação: ‘olha, essa semana vamos mandar tantos contêineres, a próxima semana tantos’. É um tiro curto, porque são praticamente 70 dias.”

A preocupação do setor é com os impactos econômicos caso a tarifa seja mantida:

“Essa taxação de 50% torna inviável mandar manga para os Estados Unidos. Os produtores, os exportadores vão ter prejuízo. Se disserem ‘não’, então vamos mandar para a Europa. Mas a Europa não aguenta essa quantidade toda. Eu tô falando de praticamente 2.500 contêineres. Nem os clientes da Europa vão querer receber porque não tem onde botar. Vai ser prejuízo. Se disserem ‘vamos mandar aqui dentro do Brasil’, o mercado colapsa. Não vai funcionar. Aí o temor é deixar a manga no pé, porque não compensa colher. As empresas entram em dificuldades, começa a demissão.”

Guilherme usou uma analogia para criticar a forma como a medida foi imposta pelos Estados Unidos:

“É como se o dono da casa chegasse para o inquilino e, sem dizer nada, mandasse uma nota de despejo pela justiça. Não custava nada o governo americano dizer: ‘olha, vamos precisar aumentar a tarifa, precisamos de dinheiro, vamos conversar’. Isso é o que se espera de um parceiro.”

Impacto nas exportações

De acordo com dados da Abrafrutas, os Estados Unidos absorveram 7% do volume total de frutas exportadas pelo Brasil em 2024, o que representa 12% do faturamento do setor. Quando se trata de mangas, os americanos consumiram 14% do volume exportado no ano passado, correspondendo a 13% da receita total com a fruta.

Guilherme alertou que o impacto não será sentido apenas no Brasil:

“Nos EUA, 70% do suco de laranja consumido vem do Brasil. O suco vai em tonéis concentrado e é diluído lá, adicionado açúcar e embalado em fábricas americanas. Se parar de chegar esse suco, vai haver desemprego lá também. O prejuízo será dos dois lados.”

Alimentos fora da tarifa

O presidente da Abrafrutas defendeu que alimentos sejam excluídos das tarifas:

“Na negociação que o Brasil vai propor ao governo americano, a minha proposta é: se vai taxar, alimento não entra. Alimento nenhum. Carne, frango, peixe, tudo que for. Por quê? Porque no mundo inteiro tem gente passando fome. Até nos Estados Unidos. Tem gente que toma café e não sabe o que vai almoçar. Então precisa ter responsabilidade com a vida das pessoas. É razoabilidade, humanidade, amor ao próximo.”

Negociação em andamento

O encontro foi coordenado pelo vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, que agora lidera a interlocução com os norte-americanos.

“Alckmin é um homem experiente, foi quatro vezes governador de São Paulo. Eu tenho acesso tranquilo a ele. O governo brasileiro está em negociação e esperamos, a qualquer momento, uma novidade. Pode ser que a taxação baixe. A ideia também foi: por que não postergar essa aplicação em 90 ou 100 dias? Isso daria tempo para organização e planejamento.”

Guilherme concluiu com um apelo pelo bom senso:

“Vocês me conhecem, sabem que eu ando na China, em todo lugar do mundo para abrir mercado. Eu não me canso porque essa causa é nobre. Sou engenheiro agrônomo, apaixonado pela fruticultura. E agora é aguardar, ver se o diálogo prevalece. Porque se essa decisão for mantida como está, vamos enfrentar um colapso no setor.”

A expectativa é que novas reuniões ocorram ainda nesta semana entre representantes do setor produtivo e o governo federal, enquanto articulações com importadores e parlamentares dos Estados Unidos também estão sendo feitas na tentativa de barrar ou ao menos flexibilizar a medida.