Um estudo clínico publicado nesta quarta-feira na revista científica New England Journal of Medicine (NEJM) comprovou a eficácia do lenacapavir, um novo medicamento injetável apenas duas vezes ao ano, para prevenir uma infecção pelo HIV. Nos testes, que envolveram cerca de 3,3 mil participantes, as aplicações semestrais levaram a uma redução de 96% no risco de contaminação.
O trabalho, chamado de Purpose-2, é o segundo a confirmar a alta eficácia do fármaco – em julho deste ano, os primeiros resultados, do Purpose-1, foram publicados pela farmacêutica Gilead Sciences no mesmo periódico. O medicamento já é vendido com o nome comercial de Sunlenca, porém apenas para o tratamento de casos de HIV multirresistentes, e não como estratégia de profilaxia pré-exposição (PrEP), ou seja, de prevenção para pessoas não infectadas.
A PrEP para o HIV não é algo novo, porém hoje é feita por meio de comprimidos que precisam ser tomados diariamente. Essa modalidade também tem uma alta eficácia, que chega a ser superior a 90%, e está disponível no Brasil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2017. No entanto, a adesão diária aos comprimidos é um desafio no tratamento.
Até então, o medicamento mais avançado de longa duração era o cabotegravir, da GSK, que precisa ser aplicado somente a cada dois meses. Ele chegou a ser aprovado pela Anvisa em junho do ano passado. Agora, o lenacapavir surge como uma estratégia promissora por promover a alta eficácia, mas com somente uma aplicação a cada semestre.
Quando os primeiros dados do remédio foram divulgados, o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS) emitiu um comunicado em que disse “receber com entusiasmo” e que a inovação “oferece esperança de acelerar os esforços para acabar com a Aids como ameaça à saúde pública até 2030”.
Esse maior esforço para alcançar o objetivo é necessário já que, embora as lideranças mundiais tenham se comprometido a reduzir as novas infecções anuais pelo HIV para menos de 370 mil, em 2023 houve 1,3 milhão de novos diagnósticos, mais de três vezes a meta atual.
Estudo confirma eficácia
O novo estudo, publicado no NEJM, teve o diferencial de envolver um público mais diverso. Enquanto o primeiro trabalho analisou apenas mulheres cisgênero (que se identificam com o gênero atribuído ao nascerem) em regiões da África Subsaariana, o Purpose-2 englobou indivíduos de diferentes gêneros, como homens cis e pessoas trans, e de diferentes etnias – foi conduzido em 88 centros de pesquisa no Peru, Brasil, Argentina, México, África do Sul, Tailândia e Estados Unidos.
Ao todo, 3.265 voluntários foram divididos em dois grupos: dois terços dos participantes (2.179) foram incluídos no primeiro, que recebeu o lenacapavir injetável a cada seis meses, e um terço (1.086) utilizou a PrEP diária em comprimidos. No final do estudo, dois casos de HIV foram identificados no primeiro grupo, e nove no segundo.
A primeira análise comparou a incidência entre os que receberam o lenacapavir em relação à incidência do HIV em uma amostra separada de 4.634 pessoas da população geral, que não receberam os medicamentos. Os resultados mostraram uma eficácia de 96% associada às injeções semestrais.
Em seguida, os pesquisadores também compararam a incidência de HIV no grupo do lenacapavir com a observada entre aqueles que usaram a PrEP oral. Os dados também mostraram que a injeção proporcionou uma proteção maior do que a dos comprimidos. O remédio foi bem tolerado e considerado seguro.
— Os resultados deste estudo aumentam o arsenal de novas ferramentas para a prevenção do HIV. Os antirretrovirais de ação prolongada oferecem uma nova esperança para aqueles que não podem tomar medicamentos orais. O desafio agora é implantar e tornar essas ferramentas disponíveis e acessíveis de forma equitativa, somente assim veremos as novas infecções por HIV diminuírem drasticamente local e globalmente
O anúncio veio depois que organizações como a Unaids se posicionaram pedindo que a farmacêutica garantisse o amplo acesso ao medicamento. Isso porque hoje o lenacapavir é protegido por patente e custa cerca de US$ 40 mil por ano para cada paciente, o equivalente a cerca de R$ 238 mil na cotação atual. Porém, pesquisadores estimam que uma versão genérica poderia custar apenas US$ 100, cerca de R$ 597 reais. (Fonte: Agência/ O Globo) (Foto: Pixabay)