CID 10 – F20.0 – Esse código escrito num laudo psiquiátrico mudou para sempre a vida do filho de Rosimeire Cordeiro Pinheiro. Ele trabalhava em Recife e viu no ingresso como soldado no 72º Batalhão de Infantaria Motorizada a chance de retornar a Petrolina e morar perto da família. Porém, ainda durante o treinamento militar o sonho se transformou em pesadelo. O jovem de 21 anos desenvolveu a esquizofrenia paranoide, significado dessas letras e números informados no início da matéria, que pertencem a Classificação Internacional de Doenças (CID).
De acordo com o laudo médico repassado pela psiquiatra que atende em um hospital particular de Petrolina, o rapaz apresentava em outubro do ano passado “alucinações visuais e auditivas, pensamento desorganizado, apesar do uso de medicação”. Também há um laudo atestando sintomas depressivos. Assim, ele foi afastado da atividade no segundo semestre do ano passado e até hoje não conseguiu retornar.
Treinamentos
Segundo Rosimeire, esse quadro é fruto da metodologia utilizada nos treinamentos. “Ele passou um dia sem beber água e desmaiou. Levaram para o Memorial e lá foi constatado que ele teve início de AVC. O médico disse que se passassem mais cinco minutos (sem socorro), não iria sobreviver. Mas eles não falam sobre essa questão, não colocam no processo, no caso dele. E a todo momento os integrantes do Exército tentam provar que ele já tinha esse problema de saúde. Só que para ser admitidos, todos passam por vários exames, todo um processo. E ele não tinha (a esquizofrenia). Antes trabalhava numa empresa de gesso, depois numa empresa de informática. Então, ele não tinha esse problema”, relatou.
Diante disso, a família do soldado busca uma solução definitiva junto ao Exército Brasileiro para custear o tratamento do jovem e uma fonte renda, inclusive para custeio dos remédios constantemente receitados. “A gente está com a Defensoria Pública, mas eles (integrantes do Exército) ficam só adiando para não dar solução do problema. Dizem que teremos que ir quarta-feira, tem que vir tal dia, vai ter que ser ouvido por tal pessoa e ele relata o caso, mas não é suficiente, já tem que passar para outra pessoa”.
Burocracia
Enquanto não há um desfecho satisfatório, Rosimeire ainda relata os entraves relativos a continuidade do tratamento. A mãe do rapaz explicou ao Nossa Voz que há uma burocracia na liberação das guias autorizando exames e consultas e isso tem prejudicado a eficácia das medicações receitadas, pela descontinuidade do uso pela falta de receita para remédios controlados. Além disso, o paciente sofre com efeitos colaterais e o custeio de um novo especialista foi barrado.
“Eu não sei mais nem como estou por conta de tanto problema. Porque tem que estar com ele o tempo todo, tem que acompanha-lo a todos os lugares. Ele tentou se matar várias vezes, se queima. É uma situação constrangedora e a gente está precisando de ajuda para ver se desenrola essa situação, porque ele precisa de tratamento, desenvolveu problema gástrico, não liberam a guia para essa especialidade. É uma situação terrível”.
Alerta para outros soldados
Por fim, ela chama a atenção para que as famílias de outros soldados fiquem atentas a possíveis mudanças de comportamento. “Peço ajuda para o que aconteceu com ele, não aconteça com outros muitos da própria turma dele que sofreram algo parecido. Espero que possam denunciar. Meu filho não tem mais vida. Isso começou nos treinamento, mas continuou depois com muitas torturas físicas e psicológicas. Tais coisas não são previstas no Regulamento Interno e dos Serviços Gerais e nas Leis Militares. Abuso de poder, humilhação, racismo e muitas outras coisas acontecem”.
O Nossa Voz entrou em contato com 72 BIMtz através do setor comunicação social.
Em nota foi informado que:
“O Soldado do Efetivo Variável Nathan William Cordeiro Pinheiro incorporou no 72º Batalhão de Infantaria Motorizado no dia 1º de março de 2019, para prestar o serviço militar obrigatório.
O militar citado não chegou a ser submetido a atividades intensas, tendo, no dia 11 de março de 2019, apresentado comportamentos que sugeriam um possível problema de saúde de ordem psiquiátrica, sendo afastado das atividades da OM com a finalidade de realizar tratamento médico.
O militar vem sendo acompanhado pela Formação Sanitária do Batalhão, recebendo guias para atendimento médico especializado na rede particular de Petrolina e no Hospital Militar Área de Recife, tendo sido disponibilizado todos os meios para promover o seu tratamento.
É importante salientar que, não se mostra razoável vincular o problema reclamado as atividades básicas da formação militar, pois, o quadro de saúde que reclama não é regra nos jovens que prestam serviço militar obrigatório.
O 72º Batalhão de Infantaria Motorizado, desde o princípio, vem prestando todo apoio médico necessário ao tratamento de saúde do militar e reforça que rechaça todo e qualquer tipo de tratamento degradante”.