O Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) solicitou à corte, nesta sexta-feira (7), que apure se há ilegalidade na resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que, na prática, dobrou os valores de diárias nacionais que juízes e ministros podem receber ao mês.
O pedido, feito pelo subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, afirma que o aumento concedido aos magistrados “é potencialmente nocivo aos cofres e interesse públicos”.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, a medida aprovada no fim de 2023 gerou um efeito cascata nos tribunais superiores, que têm turbinado salários de magistrados em mais de R$ 10 mil mensais.
As diárias são pagas aos servidores que se deslocam a serviço, em caráter eventual ou transitório, para outra localidade do território nacional.
O subprocurador disse que o CNJ não tem competência para estabelecer, por meio de normativo próprio, o aumento de vantagens a juízes, “sendo flagrante a inconstitucionalidade do aumento de remuneração concedido”.
Segundo Furtado, para isso deve haver participação do Poder Legislativo, “a quem compete aprovar a lei específica que deve tratar de tal aumento”.
“Em meu entendimento, é clara a ilegalidade dessa concessão de vantagem a tais carreiras por via administrativa. A Constituição estabelece que a remuneração dos servidores públicos e o subsídio dos membros de Poder somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso”, escreveu.
Ele também destacou que a Constituição define “claramente” que os membros do Judiciário serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única.
Por essa norma, é vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória.
“Considero que os membros das carreiras beneficiadas pelo normativo do CNJ passaram a contar com gratificação definida ilegalmente via resolução e em acúmulo ilegal ao subsídio, que já era percebido pelas carreiras, ato maculado pela inconstitucionalidade acima levantada”, disse.
O subprocurador acrescentou que a medida viola os princípios da moralidade administrativa e economicidade. Diante disso, defendeu a atuação do TCU “de forma a sanar os efeitos danosos advindos dessas ilegalidades, nos termos definidos pela Constituição Federal”.
De 2016 a 2023, o valor máximo que os magistrados recebiam por uma diária era de R$ 700. Havia ainda um limite de 6,5 diárias por mês, o que representava um teto próximo de R$ 4.500 para esse benefício.
Com a decisão do CNJ, o valor subiu para R$ 1.055,22, e a limitação foi expandida para até dez diárias ao mês. Em tese, a quantia autorizada para o pagamento das diárias é ainda maior, de R$ 1.318. O corte de quase R$ 300 ocorre devido a um teto estipulado na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias).
As diárias são verbas indenizatórias, portanto podem extrapolar o limite legal de remuneração no serviço público, hoje de R$ 44 mil.
Neste ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) gastou ao menos R$ 1,2 milhão para pagamentos referentes a dez diárias mensais (que somam R$ 10,6 mil). Foram feitos 117 pagamentos com esse valor para juízes auxiliares e de instrução.
Segundo a assessoria de imprensa do STF, há 36 juízes designados para atuar na corte, e somente dois, que moram em apartamentos funcionais do tribunal, não recebem diárias.
Cinco juízes que recebem as diárias do Supremo são vinculados ao TJDFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios).
Cada gabinete tem em média três juízes auxiliares ou instrutores, responsáveis por auxiliar os ministros na confecção de votos.
Segundo o STF, todos os juízes que estão deslocados de sua atuação de origem têm direito a receber os valores das diárias como forma de indenização por estarem fora de suas casas nas cidades onde atuam como magistrados.
No CNJ, 35 juízes auxiliares receberam “cotas de diárias mensais” em abril, sendo que 26 receberam o valor máximo de R$ 10,6 mil. Outros quatro receberam R$ 9.400.
O conselho justificou que todo e qualquer servidor ou magistrado em atividade fora de seu domicílio recebe diárias, conforme previsto na legislação. Os valores e critérios são objeto de regulamentação própria.
O CNJ também afirmou que as atualizações seguem a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que autoriza o pagamento de diária para deslocamento a serviço no território nacional, em legislação de 2015.
O novo valor, afirma o órgão, foi atualizado pelo IPCA acumulado desde a entrada em vigor da lei.
Além disso, acrescentou que recebem o valor os juízes auxiliares que moram em Brasília e não possuem domicílio permanente no Distrito Federal. Eles começam a receber o benefício a partir do momento em que são convocados e designados para o trabalho no CNJ na capital.