A Polícia Federal em Juazeiro deflagrou, nesta semana, duas operações que chamaram a atenção pela gravidade e pelo alcance dos crimes investigados. A Operação Raízes de Papel II mirou um esquema de concessões indevidas de benefícios previdenciários, enquanto a Operação Radícula levou à prisão preventiva de um homem suspeito de armazenar e produzir material de abuso sexual infantojuvenil.
As ações foram detalhadas pelo delegado Ulisses Assis Andrade, chefe da Delegacia da PF em Juazeiro.
Segundo a investigação, o grupo criminoso atuava principalmente na concessão irregular do salário-maternidade rural. As mulheres eram recrutadas sob a promessa de que teriam direito automático ao benefício apenas por estarem grávidas ou no período pós-parto.
Com documentos pessoais fornecidos pelas beneficiárias, o esquema forjava contratos de arrendamento rural e até depoimentos testemunhais para comprovar uma atividade agrícola inexistente.
“Essas mulheres eram, na maioria das vezes, cooptadas como se, apenas pelo fato de terem um filho, já tivessem direito ao benefício. Elas entregavam seus documentos pessoais, certidões de nascimento, e o grupo criminoso providenciava o restante. Muitas sequer tinham ciência de que estavam inseridas em um esquema ilegal. Algumas recebiam os valores, descontados em parte pelo grupo, mas outras não recebiam absolutamente nada, porque o dinheiro ficava integralmente com os fraudadores”, explicou o delegado.
Na segunda fase da operação, a PF identificou a participação de um servidor do INSS em Sobradinho (BA), que fornecia informações privilegiadas para facilitar o andamento dos processos, e de uma empresa no Rio de Janeiro utilizada para lavagem de dinheiro. Uma advogada de Juazeiro, apontada como líder do grupo, também voltou a ser alvo da investigação.
De acordo com a PF, na primeira fase da operação o prejuízo estimado foi de R$ 160 mil. O valor total ainda está sendo levantado.
“Esse servidor recebia valores para dar informações, orientar quais casos poderiam passar e até agilizar alguns atendimentos. Embora não fossem quantias expressivas para a função que ele exercia, isso demonstrava a participação dele no esquema. A advogada, por sua vez, já havia sido identificada desde a primeira fase como líder do grupo e continuou sendo alvo nesta segunda etapa, com provas de que organizava contratos forjados e testemunhos falsos para dar sustentação às fraudes”, afirmou Andrade.
Durante a análise do material apreendido na primeira fase da Raízes de Papel, os policiais encontraram conteúdo de exploração sexual infantojuvenil. A descoberta levou à abertura de um novo inquérito e à deflagração da Operação Radícula, que resultou na prisão preventiva de um dos alvos.
Segundo a PF, o suspeito utilizava o jogo online Free Fire para se aproximar de crianças e conquistar a confiança delas. A partir dessa relação, pedia que enviassem imagens íntimas.
“O que verificamos foi que esse alvo utilizava o jogo Free Fire para se aproximar de crianças, ganhar a confiança delas e, a partir daí, começar a solicitar imagens de conteúdo sexual. É uma prática que a Polícia Federal tem combatido com muita atenção. Infelizmente, muitos pais acreditam que o fato de os filhos estarem dentro de casa já garante segurança, mas esquecem de fiscalizar o ambiente virtual, onde esses criminosos constroem relações de confiança e depois passam a exigir conteúdos íntimos ou até impor desafios que podem levar adolescentes a situações graves, inclusive fatais”, disse o delegado.
Orientação à população
O delegado reforçou que mulheres só devem buscar benefícios previdenciários diretamente pelos canais oficiais do INSS.
“Se uma mulher sabe que nunca trabalhou na zona rural e, ainda assim, alguém a orienta a entrar com pedido de salário-maternidade rural, é preciso desconfiar. Muitas vezes essas pessoas são enganadas, mas em outras acabam sendo coniventes, porque têm ciência de que não fazem jus ao benefício. Isso não prejudica apenas o INSS, mas toda a sociedade, já que fraudes contribuem para o chamado ‘rombo da previdência’ e afetam as contas públicas”, alertou.
Além das fraudes no salário-maternidade, a PF também investiga outros esquemas, como o do seguro-defeso – destinado a pescadores em período de reprodução dos peixes –, onde há indícios de número de beneficiários muito superior ao de trabalhadores da pesca em alguns municípios.
“Temos casos em que o número de pescadores cadastrados supera o de pessoas economicamente ativas da cidade. Isso mostra a dimensão do problema e a necessidade de fiscalizações constantes. Felizmente, contamos com apoio das corregedorias e dos próprios servidores do INSS, que em sua maioria são extremamente competentes e colaboram para identificar desvios. Mas, quando há envolvidos, a PF atua para responsabilizar sem qualquer tipo de acobertamento”, concluiu o delegado.