O Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural (CEPPC/PE), vinculado à Secretaria de Cultura de Pernambuco (Secult-PE), em reunião ordinária realizada nesta quinta-feira (22), na Academia Pernambucana de Letras (APL), deu parecer favorável ao Registro do Reisado de Pernambuco como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado. A solicitação para a abertura do processo de reconhecimento do bem cultural teve início em 10 de setembro de 2022, formulada pelo coletivo Movimento Viva Reis. O CEPPC/PE designou a conselheira Mônica Siqueira da Silva como relatora do processo, que foi lido e analisado em conjunto pelos membros do órgão.
Após a votação do CEPPC/PE e da publicação da resolução a respeito da decisão, será publicado o decreto do Governo de Pernambuco, que oficializa o registro do bem nos livros de registro do Patrimônio Cultural Imaterial de Pernambuco. A partir de então, haverá a elaboração do plano de salvaguarda, com a participação da comunidade.
“O foco é fortalecer o Patrimônio Imaterial em todos os sentidos, e uma dos pilares do CEPPC/PE é ampliar o quadro de registro dos Patrimônios Imateriais no Estado. Esse é o segundo relatório que faço e a ideia é aqui, em nossos pareceres, é que esses bens sejam mais valorados. O Reisado é um bem cultural muito importante, mas não tem a mesma visibilidade que outros tem. Por isso, o reconhecimento do título é muito importante. Os grupos são bons, têm muita dedicação e força para manter a tradição. O movimento Viva Réis, que solicitou o título, vem dizer isso, que os Reisados estão vivos”, disse Mônica Siqueira, uma das relatoras do processo.
SOBRE O BEM CULTURAL – Os Reisados apresentam importância sócio-histórica e cultural e se configuram como forma de expressão enraizada em tradições votivas do catolicismo popular, bem como em festividades cíclicas, ligada especialmente ao Ciclo Natalino e às festas dos Santos Reis. Essa manifestação integra música, dança, personagens, encenação de entremeios, louvação e cortejo.
O enredo dos autos encenados no Reisado em Pernambuco dá-se comumente com os seguintes elementos: Marchas de Rua, Pedido de Abrição de Porta, Marchas de Entrada de Sala, Louvação aos donos da casa, Louvação ao Divino, Guerra e Retirada. Os autos são entremeados com danças dramáticas, como as Guerras Totêmicas e a Farsa do Boi; com peças cantadas de motivos românticos ou circunstanciais; e com as Embaixadas, que são partes declamadas.
Os entremeios são as apresentações, com ou sem falas e diálogos, de personagens humanos ou animais com roupas, nomes e gestos próprios. Costumam ocorrer nos momentos em que os músicos param de tocar, mas também podem ser realizadas com a música caraterística do personagem. Os entremeios mais comuns são: Zabelê (Jaraguá), Cavalo-marinho, Sapateiro, Boi, Urso e Anastásia.
Os principais personagens do Reisado são o rei, a rainha, o mestre, o contramestre, os embaixadores, os figurantes e um Mateus, sendo acompanhados ao menos por um violeiro, mas é comum terem mais músicos. O rei, o mestre e contramestre começam a história, seguidos dos dançadores de entremeios. Cada personagem do Reisado possui uma indumentária ricamente elaborada que o distingue e o saber-fazer e a estética dessas indumentárias são importantes para essa expressão cultural. A presença de guerreiros e batalhas, em alusão à luta entre cristãos e mouros, mas sobretudo a presença de animais nos entremeios distingue o Reisado no Nordeste.
Enquanto celebração para o Dia de Reis, o Reisado possui uma série de referências da religião cristã e, como em outras celebrações do catolicismo e religiosidade popular, também possui um lado profano. O Reisado é tradicionalmente organizado por devoção ou pagamento de promessas. O devoto de Reis busca alcançar alguma graça e se compromete a participar da manifestação por um período de sete anos, muitas vezes estendido. Em razão do pagamento de promessas, não é raro que o Reisado seja realizado em outras datas em devoção a santos padroeiros, em especial no período junino. Portanto, essa expressão cultural não ocorre somente no Ciclo Natalino, podendo ser brincada em vários momentos do ano.
HISTÓRICO DO PROCESSO – Entre os anos de 2012 e 2014, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco – Fundarpe e a Secretaria de Cultura do Estado realizaram o Inventário Nacional de Referências Culturais do Reisado em Pernambuco, promovendo a pesquisa para identificação desta expressão cultural, destacando as singularidades de sua presença nas diferentes regiões do Estado. A investigação encontrou grupos de Reisado tanto em Recife, quanto em Garanhuns, Capoeiras (povoado da Maniçoba), Paranatama, Águas Belas, Arcoverde, Sertânia, Pedra, Petrolina, Santa Maria da Boa Vista, Lagoa Grande e Tacaratu.
Como resultado do mapeamento dos Reisados de Pernambuco, observou-se a organização dos detentores, em duas diferentes regiões onde os grupos estão mais concentrados: Agreste Central, especialmente no município de Garanhuns, e Sertão de Itaparica e São Francisco. Nessas duas regiões, formaram-se movimentos espontâneos entre os detentores para a valorização das tradições do Reisado por meio de apresentações, eventos culturais, seminários e atualização de pesquisas. Dessa articulação, em julho de 2019 realizou-se, durante o Festival de Inverno de Garanhuns (FIG), o 1º Seminário Reisados do Agreste, em Garanhuns, e em dezembro do mesmo ano o Encontro de Reisados em Santa Maria da Boa Vista, articulado pelo Movimento Viva Reis, apoiado pelo projeto Natal das Tradições da Secult-PE e Fundarpe.
PATRIMÔNIOS VIVOS – Além do Registro como Patrimônio Imaterial de Pernambuco, vale salientar a titulação e registro como Patrimônios Vivo do Estado de Pernambuco para o Mestre Gonzaga de Garanhuns, do município de Garanhuns, do Reisado da Comunidade Quilombola do Inhanhum e mais recentemente da Mestra Maria Jacinta, esses dois últimos, do município de Santa Maria da Boa Vista, representantes dos Reisados do Agreste e Sertão do Estado.
ÂMBITO NACIONAL – Em 12 de dezembro de 2014, a Secretaria de Pernambuco formalizou junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan , o pedido para o registro do Reisado de Pernambuco como Patrimônio Cultural do Brasil. Na ocasião, que contou com a presença de grupos de Reisado do Agreste e da Região Metropolitana, foi entregue ao Iphan os resultados no o Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC do Reisado, produzido entre os anos de 2012 e 2014 pelo Governo do Estado.
A partir do requerimento de registro do Reisado de Pernambuco o Iphan pronunciou-se a favor da ampliação da abrangência da pesquisa para a região Nordeste, no sentido de verificar aspectos semelhantes e singularidades do Reisado, Folias de Reis e Ternos de Reis em outros estados, alterando a nomenclatura do processo para Registro dos Reisados do Nordeste. O processo segue aguardando complementação da pesquisa e está disponível para consulta no link: portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1564 (Processo SEI-IPHAN: 01450.000868/2015-69).
(Cultura PE)