Com a chegada dos meses mais frios e secos no Sertão, cresce a preocupação com a saúde respiratória das crianças. Entre os meses de fevereiro e maio deste ano, o Hospital Dom Malan, em Petrolina, registrou mais de 4 mil atendimentos por doenças respiratórias apenas no pronto-socorro infantil — um número expressivo que escancara o impacto da sazonalidade sobre a saúde pediátrica na região.
Os principais agentes causadores dessas infecções são os vírus influenza A e B, além do Vírus Sincicial Respiratório (VSR), este último responsável por grande parte das internações de bebês e crianças pequenas com síndrome respiratória aguda grave (SRAG).
Para falar sobre os riscos, sintomas, prevenção e cuidados essenciais, o programa conversou com a médica pediatra Daniele Barreto, do Hospital Dom Malan, referência em atendimento infantil pela rede estadual de saúde. A profissional detalhou o cenário atual e reforçou a importância de diferenciar os casos comuns de gripe dos quadros graves.
“Na verdade, esse vírus sempre está presente, principalmente entre março e agosto, mas nesse período há um aumento significativo da demanda. Isso sobrecarrega os hospitais. É importante que os pais saibam que, inicialmente, a maioria dos casos pode ser tratado em casa. Quando todos correm direto para o hospital, acaba havendo superlotação, o que impacta diretamente a qualidade e agilidade do atendimento”, explicou a pediatra.
Segundo Daniele, os sinais de alerta que devem levar os pais a buscar atendimento emergencial incluem: respiração ofegante, sonolência excessiva, desidratação, apatia e recusa alimentar. Esses sintomas indicam que a criança pode estar desenvolvendo uma síndrome respiratória aguda grave, que requer cuidados hospitalares imediatos.
“É fundamental observar o comportamento da criança. Uma febre leve acompanhada de brincadeiras e apetite indica um quadro mais tranquilo. Mas, se a febre vier junto de apatia, fraqueza ou dificuldades para respirar, isso já acende um alerta. O tratamento em casa deve incluir hidratação, lavagem nasal, boa alimentação e, para os que estão em fase de aleitamento, a manutenção da amamentação. O leite materno é um dos maiores aliados da imunidade infantil”, destacou.
Sobre o Vírus Sincicial Respiratório, a médica foi categórica ao dizer que o perigo está na sua ação inflamatória sobre os brônquios. Em crianças pequenas, especialmente prematuras ou com histórico de doenças respiratórias, a gravidade pode aumentar.
“O VSR provoca bronquiolite, uma inflamação nos brônquios com acúmulo de muco. Crianças muito pequenas têm dificuldade para expelir essa secreção, o que pode evoluir para quadros graves de falta de ar. Isso é agravado pelo fato de que prematuros têm vias aéreas menores e o sistema imunológico ainda imaturo”, explicou Daniele.
Outro ponto abordado foi a febre — motivo frequente de preocupação e busca por atendimento de urgência. Segundo a pediatra, a febre por si só não é um problema, mas sim um indicativo de que o organismo está reagindo a uma infecção.
“A febre é um mecanismo natural de defesa. O que deve preocupar é o motivo da febre, não o número no termômetro. Se a criança estiver ativa, brincando, mesmo com 38 graus, pode ser tratada em casa. Mas se ela estiver molinha, sonolenta ou com febre por mais de 72 horas, deve ser levada para avaliação médica. E atenção: sempre seguir a dose prescrita pelo pediatra. Automedicação é um risco grave”, reforçou.
Entre os casos registrados, a reincidência também é comum, especialmente em crianças que frequentam creches e escolas. Para esses casos, a recomendação é redobrar os cuidados com higiene nasal e alimentação rica em nutrientes.
“Quando a criança vai para a escola, ela sai da ‘bolha’ de proteção e passa a ter contato com diversos vírus. Isso é normal, mas os pais devem adotar rotinas preventivas. A principal delas é a lavagem nasal ao chegar em casa. Os vírus respiratórios entram principalmente pelo nariz. Alimentação rica em frutas, principalmente com vitamina C, também ajuda a fortalecer o sistema imunológico”, orientou Daniele.
Sobre o fluxo de atendimento, a médica fez questão de esclarecer a importância de procurar o serviço adequado, de acordo com a gravidade dos sintomas. A rede de saúde de Petrolina conta com atenção básica nas unidades de saúde, além da UPA, que também abriu leitos pediátricos.
“O ideal é procurar o posto de saúde nos primeiros sintomas. Se houver piora, cansaço extremo ou febre persistente sem causa definida, aí sim é momento de ir ao hospital. Ir direto ao hospital sem necessidade pode expor a criança a outras infecções e agravar o quadro. A UPA está funcionando e é um recurso importante. Mas lembrar: só o Dom Malan faz internamento”, pontuou.
Ao ser questionada sobre eventuais óbitos infantis em decorrência desses quadros, a médica afirmou que não possui os dados atualizados, mas reforçou que a maioria das complicações graves pode ser evitada com a busca correta por atendimento e cuidados domiciliares adequados.
Sobre a convulsão febril, comum entre crianças de seis meses a cinco anos, a médica tranquilizou os pais:
“Convulsão febril é comum nessa faixa etária e, geralmente, não deixa sequelas. Não é a febre alta que causa, mas a suscetibilidade da criança. O importante é manter a calma, proteger a criança de lesões durante a crise, não colocar nada na boca e buscar orientação médica depois que passar. Se houver repetição de crises em menos de 24 horas, aí sim é mais preocupante”, alertou.
Por fim, a pediatra reforçou a importância da vacinação — especialmente contra influenza — como forma eficaz de evitar as formas graves da doença.
“A vacina da gripe não impede a criança de se infectar, mas reduz drasticamente o risco de evolução para quadros graves. Muitos pais não levam os filhos para vacinar porque estão com tosse, mas tosse não é impedimento. A febre, sim. É essencial manter o calendário vacinal atualizado. A vacina está disponível gratuitamente no SUS, nos postos de saúde. É um direito e uma proteção que não deve ser ignorada”, concluiu.