Superlotação no Dom Malan acende alerta sobre rede municipal de saúde em Petrolina

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A sazonalidade das Síndromes Respiratórias Agudas Graves (SRAG) tem provocado um aumento expressivo nos atendimentos pediátricos no Hospital Dom Malan, em Petrolina. A unidade estadual, referência materno-infantil para todo o Sertão pernambucano, tem enfrentado uma pressão sem precedentes: em maio, foram registrados mais de 4.600 atendimentos infantis — mais que o dobro do volume registrado em janeiro.

Os dados preocupam. Segundo o próprio hospital, mais de 90% dos pacientes atendidos vêm de Petrolina, o que evidencia não apenas o avanço da sazonalidade viral, mas também um possível colapso na rede municipal de saúde, que deveria absorver os casos de menor complexidade.

Para compreender o que está sendo feito diante desse cenário, o programa Nossa Voz, da Rádio Grande Rio FM, conversou ao vivo com o secretário executivo de Gestão Estratégica da Secretaria Estadual de Saúde, Anderson Oliveira.

Segundo o gestor estadual, o aumento repentino está diretamente ligado ao avanço do vírus sincicial respiratório em Pernambuco:

“Desde das últimas semanas epidemiológicas, a partir ali da semana 18, nós estamos nesse momento na semana epidemiológica número 23. Ou seja, faz umas três ou quatro semanas que a circulação viral do vírus sincicial respiratório começou a aumentar muito em todo o estado de Pernambuco. Os dados epidemiológicos apontam que a gente pode estar passando pelo pior momento em relação à circulação viral. E a consequência dessa circulação viral alta é justamente assistencial, porque nós temos muitas crianças adoecendo ao mesmo tempo.”

Diante desse cenário, o governo estadual decretou, na última quarta-feira, estado de emergência por 90 dias. O foco da atenção tem sido as crianças menores de dois anos, mais suscetíveis às complicações da bronquiolite — uma das principais doenças causadas pelo vírus.

Contudo, Anderson Oliveira destaca que o problema não está restrito à sazonalidade:

“O Hospital Dom Malan é um hospital de referência, que deve absorver casos de média e alta complexidade. O que está acontecendo hoje é uma sobrecarga por conta do primeiro atendimento — o pré-atendimento. E aí, o papel da rede municipal é fundamental. É necessário que a rede municipal tenha um nível de organização que possa dar esse primeiro atendimento à criança. Apenas as que precisarem de internamento ou UTI devem ser encaminhadas ao Dom Malan.”

O secretário também ressalta que essa falha compromete todo o funcionamento da unidade estadual:

“Nós temos, como você já colocou, mais de 90% dos atendimentos sendo de munícipes de Petrolina. Isso vai trazer consequências muito drásticas para a unidade, que se prepara para atender pacientes referenciados. A ausência de um serviço municipal de urgência pediátrica 24 horas pode estar agravando a situação.”

Questionado sobre as ações planejadas para evitar o colapso do sistema, Oliveira detalha que o Estado preparou um plano de contingência ainda em janeiro, com foco específico na pediatria, mas que ele depende da integração com os municípios:

“Hoje, o principal responsável no nível de organização do sistema de saúde por executar a atenção primária é o componente municipal. É necessário que essa rede esteja organizada, inclusive nos finais de semana, sem interrupções. O Dom Malan está atendendo tanto pacientes que deveriam estar em UBS ou UPAs, quanto casos graves. Isso é insustentável.”

Para aliviar a pressão, o governo estadual abriu 295 leitos pediátricos em todo o estado, sendo 53 apenas na Quarta Macrorregião, que inclui Petrolina. Mas a rede ainda precisa de reforço da atenção básica e da sociedade:

“Precisamos que os pais façam sua parte. Se a criança está gripada, não deve ir à escola. Devemos evitar passeios com bebês menores de dois anos. São atitudes simples, mas que podem evitar que a situação piore.”

Sobre o destino das crianças quando o Dom Malan atinge a capacidade máxima, o secretário explica que há um sistema de regulação ativo:

“Temos leitos em Ouricuri, Salgueiro, e também na rede interestadual PEBA, compartilhada com a Bahia. Na última semana, transferimos pacientes para Ouricuri. Essas ações antecipadas evitaram um cenário ainda mais crítico.”

Atualmente, o Hospital Dom Malan possui 244 leitos, dos quais 41 são pediátricos. São 10 leitos de UTI neonatal e 10 de UTI pediátrica. Ainda assim, o Estado busca ampliar essa capacidade:

“Estamos reunidos duas vezes por semana para revisar e implementar ações de expansão. Também estamos em tratativas com hospitais privados e filantrópicos para contratualizar leitos adicionais. Isso aliviaria a rede pública neste momento crítico.”

Por fim, Anderson Oliveira reforça a importância da vacinação contra influenza e covid, especialmente entre crianças e seus cuidadores. Ele adianta que a vacina contra o vírus sincicial respiratório poderá ser incorporada ao SUS no próximo ano, inicialmente para gestantes:

“Temos uma grande chance dessa vacina estar disponível no próximo ano. A gestante vacinada passa anticorpos para o bebê, o que será um avanço importante. Enquanto isso, contamos com a organização da rede municipal, o apoio dos profissionais e a consciência da população para proteger nossas crianças.”

A superlotação no Dom Malan escancara a fragilidade da atenção básica em Petrolina e impõe a necessidade de uma ação coordenada entre município, estado e comunidade. O cenário pede respostas urgentes — e integradas.