Há no Brasil uma realidade brutal que não se deve esconder: crianças e adolescentes são violentadas todos os dias no país em ambiente doméstico e familiar. Segundo dados extraídos, no último dia 29, do painel online da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), foram registradas em 2020, pelo Disque 100, 23.351 denúncias de violência sexual (estupro, abuso, assédio e exploração), um aumento de 23,4% em relação aos 18.911 registros de 2019. A maioria dos casos, 12.523 (53,6%), aconteceu na casa da vítima e do suspeito. A proximidade afetiva entre vítima e violentador, além de outros fatores, como já é sabido, desencoraja muitas vezes a denúncia.
Neste ano, a campanha promovida pelo Ministério Público estadual, em parceria com a ONG Plan International, com apoio de instituições de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, visa romper essa barreira. Ela lembra, principalmente aos adolescentes e jovens, que o celular, aparelho tão íntimo do cotidiano deles, pode ser um poderoso aliado contra a violência sexual. A partir do próximo dia 11 de maio, as peças estarão circulando pelos canais de comunicação institucionais, principalmente nas redes sociais online do MP e também nas de influenciadores digitais parceiros. O mote da companha é “Dá para fazer muitas coisas pelo celular, inclusive quebrar o silêncio de uma violência sexual”.
Como destaca a campanha, a denúncia pode ser realizada de forma anônima, do próprio celular, nos aplicativos ‘Direitos Humanos Brasil’ e ‘Proteja Brasil’, ligando para o Disque 100, ou ainda pelo número de aplicativo de mensagem (61) 96565-5008. Entre os influenciadores digitais, que vão replicar as peças para seu público de adolescentes, estão Camila Barbosa, Malu Meneses, Noemy Damasceno, Pérola Dejus e Thainá Duarte. Apoiam a campanha o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a Safernet Brasil e o Instituto Aliança. A campanha também chegará ao TikTok, outro parceiro do MP, que convidou criadores de conteúdo da plataforma para comunicar ao seu público sobre a importância da denúncia. O objetivo é alertar que atos de violência sexual contra crianças e adolescentes não podem ser naturalizados e, sobretudo, que suas vítimas têm uma rede de proteção que pode acolhê-las.
Em 2020, foram registradas no MP 757 notícias de fato relativas à violência sexual contra criança e adolescentes. Os promotores de Justiça por todo o estado ajuizaram, ano passado, 722 ações penais, sendo que 705 delas foram casos de estupro de vulnerável. Segundo dados do Disque 100, a Bahia registrou, em 2020, 1.267 casos de violência sexual, contra 901, em 2019, um aumento de praticamente 40%, muito acima do percentual de 8,4% quando se compara 2019 a 2018, com 831 denúncias.
Segundo Helena Oliveira, coordenadora do Unicef para Bahia, Sergipe e Minas Gerais, é necessário considerar dois aspectos quando se analisa o fenômeno da violência sexual cometidas contra crianças e adolescentes: “a naturalização de como estes casos acontecem – por dentro das normas sociais nas relações familiares ou comunitárias; e a impunidade, que acaba sendo uma decorrência da primeira”. Ela destaca que “mesmo sendo a violência sexual tipificada como crime, os fóruns de apuração e responsabilização desses crimes sofrem com a morosidade e a corrupção de interesses privados. A situação na Bahia não foge a esta realidade, ao contrário, acentua esta realidade trazendo os determinantes raciais e de gênero e seus impactos na vida de meninas e meninos vítimas; e que caracterizam ainda mais a urgência pelas medidas de prevenção, responsabilização e mobilização para denúncia dos casos”, disse.